Jaboatão dos Guararapes Redescoberto.
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quinta-feira, 14 de setembro de 2023
História do Jaboatão dos Guararapes
Por James Davidson
O
município do Jaboatão dos Guararapes está localizado na Região Metropolitana do
Recife, no estado de Pernambuco. Possuindo 258 km² de área territorial, o
território do município está limitado a leste pelo Oceano Atlântico e pela
Cidade do Recife, ao oeste pelo município do Moreno, ao norte por São Lourenço
da Mata e pela Cidade do Recife e ao sul pelo município do Cabo de Santo
Agostinho. Sua população, estimada em 2021 pelo IBGE, é de 711.330 habitantes,
estando distribuída por 7 Regionais ou Distritos: Sede (Prazeres), Jaboatão
Centro, Curados, Cavaleiro, Muribeca, Guararapes e Praias. (IBGE, 2023)
Assim
como as demais regiões do Brasil, o território do Jaboatão dos Guararapes era
habitado pelos povos indígenas. De acordo com a maioria dos cronistas do
período colonial, a etnia dos indígenas Caetés ocupava toda a região situada
imediatamente ao sul do Recife até as margens do Rio São Francisco (CARDIM,
2009). Ainda de acordo com a maioria dos autores, os indígenas Caetés
pertenciam ao grupo Tupi, falavam a língua geral e adotavam um modo de vida
muito semelhante aos demais povos tupis, vivendo do cultivo da mandioca e tendo
costumes antropofágicos (SOUSA, 2010).
De
acordo com Frei Vicente Salvador (1982), o território do Jaboatão foi palco de
resistência entre indígenas e colonizadores. Nos atuais Montes Guararapes, os
indígenas Caetés ergueram uma forte paliçada, repelindo a colonização
portuguesa naquela direção, na época da primeira fase de conquista da Capitania
de Pernambuco efetuada por Duarte Coelho de Albuquerque. Todavia, após o
falecimento deste último, e com a chegada de seu irmão Jorge de Albuquerque,
teve início uma guerra de extermínio contra os indígenas da região sul da
capitania (1560-1565), incluindo contra os Caetés, que resultou na escravização
e fuga dos membros dessa etnia e na conquista de suas terras pelos
colonizadores portugueses.
Após
a conquista das terras pelos portugueses, teve início o processo de assimilação
das terras através da doação de cartas de sesmarias. Assim, a partir de 1566,
foram distribuídas várias sesmarias de terras entre os colonos europeus, nas
margens do Rio Jaboatão e de seus afluentes. A exploração da cultura da
cana-de-açúcar foi a principal atividade econômica nesse período, com a
instalação de vários engenhos de açúcar nas terras da “Ribeira do Jaboatão”.
Desta maneira, até o final do século XVI, já estavam levantadas dezenas de
fábricas de açúcar, explorando o trabalho escravo de indígenas e de africanos.
(MELLO, 2012)
Ainda
no final do século XVI, surgem na região duas povoações que seriam os embriões
da atual cidade do Jaboatão: Muribeca, levantada em terras dos engenhos
Novo e Santo André; e Jaboatão, levantada na confluência dos rios
Jaboatão e Duas Unas, nas terras do engenho São João Batista. (COSTA, 1983) Já
na última década do século XVI são registradas a existência das igrejas
matrizes dessas povoações, Nossa Senhora do Rosário, em Muribeca; Santo Amaro
em Jaboatão, com suas respectivas festas votivas. Também se registram nesse
período a presença de capelas votivas situadas na zona litorânea do município
(N.S das Candeias e Santo Antônio da Barra) bem como festividades religiosas
nas capelas dos engenhos. (VELOSO, 1984)
No
século XVII, a história de Jaboatão seria marcada pela presença da ocupação
holandesa (1630-1654). A denominada “Invasão Holandesa” em Pernambuco provocou
muitos estragos nos engenhos da região, prejudicando a produção açucareira e
favorecendo a fuga dos escravizados (MELLO, 1981). Durante as duas Batalhas do
Guararapes (1648 e 1649) os holandeses foram vencidos nos Montes Guararapes, em
Jaboatão, ficando estes fatos registrados em vários relatos e documentos da
época. A fim de celebrar e memorizar esta vitória, foi levantada no local uma
igreja votiva dedicada à Nossa Senhora dos Prazeres, no ano de 1656. Em seu
entorno são realizados, a partir de sua fundação, uma das celebrações
religiosas mais tradicionais do estado de Pernambuco – a festa de Nossa Senhora
dos Prazeres, também chamada de Festa da Pitomba. (MELLO, 1971)
Durante
o final do século XVII e no XVIII, acontecem algumas mudanças importantes na
região. A economia açucareira, apesar das várias crises que enfrentou, passa a
ter uma maior expansão na Freguesia de Jaboatão, através da doação de novas
cartas de sesmarias ao oeste. Novos engenhos e fábricas de açúcar são
levantados nesse período. Também nesta época são levantadas novas igrejas: N.s
da Piedade, na Praia de mesmo nome, erguida em 1683; N.s do Loreto, também na
Praia de Piedade, construída em 1660; N.s do Rosário dos Pretos da Muribeca,
erguida em meados do século XVIII; N.s do Livramento de Jaboatão, construída em
1774; N.s do Rosário dos Pretos de Jaboatão, também construída em meados do
século XVIII. (VELOSO, 1982)
Ainda
no final do século XVII, ocorreu a construção da nova igreja de Santo Amaro.
Segundo o historiador Pereira da Costa (1983), o fato ocorreu porque a
primitiva matriz se encontrava em ruínas e num lugar distante do principal
centro da povoação. Assim, em 1691, numa cima de uma colina próxima à povoação,
é construída a nova Igreja Matriz, devotada ao tradicional padroeiro da
localidade:
“Um
século depois, achando-se a igreja bastante arruinada, e então mal situada,
naturalmente por se estender a povoação em direção oposta, e ficar assim
distante do centro da população, resolveu o vigário da freguesia Padre Adriano
de Almeida empreender, pelos anos de 1691, a construção de um novo templo, em
situações convenientes, o que feito, o referido vigário, a Irmandade de S.S
Sacramento e várias pessoas da localidade dirigiram um requerimento ao soberano
pedindo-lhe alguns ornamentos para a celebração do culto na igreja nova que
fizeram, o qual veio para o governador Caetano de Melo de Castro informar com o
seu parecer, por carta régia de 12 de janeiro de 1697. Além destes dados
constantes do aludido requerimento, vê-se mais que se fizera a obra do templo,
de pedra e cal, com arcos, portas, cornijas de cantaria, e com duas capelas,
tudo com a perfeição possível para com mais decência se celebrarem os divinos
ofícios, e em que se gastaram oito mil cruzados.”
(COSTA, 1983)
Politicamente,
tanto as freguesias da Muribeca como de Jaboatão estavam submetidas à Vila de
Olinda, ambas até o ano de 1711. Com a elevação do Recife à condição de Vila,
no ano de 1711, passa a freguesia da Muribeca a integrar o termo desta última.
Em 1833, com a resolução provincial de 20 de maio de 1833, Jaboatão passa
também a integrar o termo do Recife, juntamente com São Lourenço e Várzea.
(HONOTATO, 1976).
Em
meados do século XIX, a economia de Jaboatão estava baseada principalmente no
cultivo da cana-de-açúcar. Segundo um levantamento estatístico realizado em
1857, em Jaboatão havia naquele ano 45 engenhos, produzindo 56.195 pães de
açúcar e 9.507 cargas de aguardente. Para o trabalho na cana-de-açúcar, havia
um total de 3.520 escravizados, segundo a referida estatística. (MELLO, 1975)
Além
da cana-de-açúcar, na economia de Jaboatão também se destacavam os seguintes
produtos: criação de gado nas Curcuranas, cultivo de melancias nas Curcuranas, cultivo
de coqueiros e cajueiros na região das praias e de Prazeres, produção de café e
de mandioca na Muribeca, cultivos de subsistência em sítios e nos engenhos.
(MELLO, op. Cit)
No
ano de 1973, por força da provincial n° 1093 de 24 de maio de 1973, o município
do Jaboatão é desmembrado do município do Recife. O novo município criado
possuía uma extensão maior que a atual, com mais de 500 km² de área
territorial. Estavam incluídos no novo município os territórios das antigas
freguesias do Jaboatão e da Muribeca, se limitando com o Recife ao leste, com
São Lourenço ao norte, com o Cabo de Santo Agostinho ao sul e com Vitória de
Santo Antão ao oeste. Abrangia os povoados de Tejipió, Pontezinha, Prazeres,
Loreto e Muribeca, bem como todo o território que no futuro se transformaria no
município do Moreno. (GALVÃO, 1910)
No
final do século XIX, o Brasil passaria por várias transformações sociais,
econômicas, culturais e políticas que trariam também mudanças no município do
Jaboatão. Entre essas mudanças, merecem ser destacado o declínio doas antigos
engenhos banguês, que passaram a ser substituídos pelas usinas e engenhos
centrais, com capacidade industrial de moagem e produção. (ANDRADE, 1989) As
Usinas de açúcar passam a dominar a paisagem rural com seus extensos canaviais
e suas chaminés imponentes, passando os antigos engenhos a condição de meros
fornecedores de cana. Outra mudança foi a abolição do trabalho escravo, em 1888.
Como Jaboatão era um tradicional município açucareiro, muitos escravizados
abandonaram o campo, emigrando em busca de melhores oportunidades nas cidades,
enquanto outros permaneceram nos engenhos se tornando mão-de-obra barata para
as usinas.
Ainda
no final do século XIX, o município do Jaboatão seria impactado pela chegada
das ferrovias patrocinadas pelo estado e pela iniciativa privada. A primeira
dessas ferrovias a cortar o município foi a Estrada de Ferro Recife-São
Francisco. Inaugurada em 1858, atravessava Jaboatão na altura da Povoação de
Prazeres. A segunda ferrovia a ser construída foi a Estrada de Ferro Central de
Pernambuco, ligando o Recife ao interior do estado. Esta ferrovia atravessou a
sede da povoação do Jaboatão, melhorando as comunicações entre a localidade e a
capital, sendo inaugurada em 25 de março de 1885. As usinas de açúcar também
instalaram suas próprias ferrovias, como as Usinas Bulhões, Muribeca e
Jaboatão, que conectavam seus engenhos e propriedades com suas sedes através de
trilhos pelos canaviais. (PINTO, 1949)
A
sede da Cidade do Jaboatão seria bastante influenciada pela presença dos
trilhos. Além da ferrovia e da Estação ferroviária, a localidade passou a
sediar também as Oficinas Ferroviárias da região. Com a concessão do sistema
ferroviário do Nordeste para os ingleses da Great Western, a importância de
Jaboatão passou a ser ainda maior, pois ocorreu a centralização nesta cidade de
todos os serviços de consertos, reparos e até mesmo a fabricação de trens. As
Oficinas de Jaboatão foram ampliadas em 1910, se tornando a principal do
Nordeste, e atraindo para a cidade centenas de trabalhadores ferroviários. A
presença dos ferroviários em Jaboatão foi tão importante que a localidade
recebeu a denominação informal de “Cidade Ferroviária”. (CAMPELO, 1919)
Além das Oficinas da Great Western, Jaboatão também passou a contar com outras indústrias no início do século XX. Entre essas podem ser mencionadas a fábrica da Societè Cotonniére Belge-Bresilienne, uma fábrica de tecidos inaugurada em 1910, dando origem ao povoado de Vila Nathan, futuro distrito e cidade de Moreno.; A fábrica de Pólvora Elephante, situada no povoado de Pontezinha; A Fábrica de Papel Pernambucana, inaugurada em 1918, situada na sede de Jaboatão; Todas essas indústrias deram ao município do Jaboatão uma grande importância econômica dentro do estado, fazendo de Jaboatão uma cidade com uma grande presença de trabalhadores e operários que passariam a ser organizar em sindicatos, realizando greves e lutando por melhores salários. (100 ANOS...,1971)
No
ano de 1928, entretanto, o município do Jaboatão teria seu imenso território
desmembrado e dividido. Por força da lei estadual n° 1931 de 28 de setembro de
1928, o então governador do estado Estácio Coimbra divide o município do
Jaboatão, criando o município do Moreno. Desmembra o Povoado de Pontezinha,
anexando-o ao município do Cabo. E por fim, anexa o Povoado de Tejipió ao
município do Recife, retirando do município do Jaboatão mais de 200 km² de área
territorial. (ARAÚJO, 1988)
Por
conta da grande presença de trabalhadores urbanos e operários organizados em
sindicatos, na cidade de Jaboatão, o município elegeu no ano de 1948 o primeiro
prefeito comunista do Brasil, o Dr. Manoel Calheiros. A Cidade de Jaboatão
recebeu o apelido de “Moscouzinha” pela imprensa da época, denominação que
seria conhecida por todo o Brasil. Embora tenha sofrido bastante pressão das
forças políticas reacionárias da cidade, o Dr. Manoel Calheiros conseguiu
concluir seu mandato, apesar de todas as polêmicas criadas pela imprensa da
época. (VELOSO, 1982)
As
décadas de 1950 e de 1960 seriam caracterizadas por importantes transformações
econômicas e territoriais no município. No ano de 1959 o município é
atravessado pela rodovia federal Br 101, que corta o município na altura do
Distrito de Prazeres. A presença dessa rodovia e o bom momento da economia do
país na época favoreceu a chegada de várias indústrias para a região (Ford Willys,
Alpargatas, Caio Norte, etc) dando origem ao Distrito Industrial de Prazeres. A
população daquele distrito que, em 1960 contava com apenas 25.390 habitantes,
pulou para 81.868 habitantes no ano de 1970, graças ao crescimento trazido
pelas indústrias e pela expansão imobiliária nas praias. (ARAÚJO, op.cit)
Em
1965 é inaugurada na região norte do município a Rodovia 25, atual BR 232. A
presença dessa rodovia atraiu várias indústrias para o setor setentrional do
município, dando origem na década de 1970 ao distrito industrial do Curado. O
crescimento dessas regiões do município, Prazeres-Praias e Curado, distantes da
sede do município, favoreceu o desejo de emancipação dos distritos do
município, notadamente na década de 1960. Todavia, os projetos de emancipação
acabaram abortados pela justiça, com o advento da Ditadura Militar no país a
partir de 1964.
Na
década de 1980, o município do Jaboatão passa novamente por novas
transformações. A principal delas foi a construção do metrô de superfície, no
ano de 1985, que modificou significativamente o Centro da Cidade de Jaboatão. O
metrô substituiu os antigos trens suburbanos que faziam a ligação entre
Jaboatão e a capital do estado, Recife, melhorando o fluxo entre as duas
cidades. Outra mudança foi a construção de vários conjuntos residências em
várias partes do município: Dom Helder, Curado I, II, III e IV, Vila Rica,
Marcus Freire e Conjunto Muribeca, que aumentaram a população e o perímetro
urbano da cidade.
No
ano de 1989, ocorre mais uma modificação na organização política do município.
O então prefeito Geraldo de almeida Melo transfere a sede
político-administrativa do município para o distrito de Prazeres. A mudança
ocorreu em virtude do maior crescimento urbano e populacional do distrito de
Prazeres e de sua zona de influência, notadamente a zona das praias, em
oposição a antiga sede de Jaboatão, com crescimento populacional mais lento e
industrial estagnado. Assim, por força da lei municipal n°4 de 05 de maio de
1989, a sede do município é transferida para Prazeres e o nome do município
passa a ser Jaboatão dos Guararapes. (MARCENA, 2004)
A
partir do ano 2000, um novo surto de transformações passa a marcar a história
do município. A construção de uma nova Br 101 sul, através do bairro de
Comportas, favoreceu a expansão industrial por aquela direção. A partir de
2006, o município passa a integrar o Território Estratégico de Suape,
favorecendo o crescimento industrial do município, principalmente pela
Muribeca, Prazeres e Comportas. A construção da Ponte do Paiva, em 2009, trouxe
uma nova valorização imobiliária para a zona das praias. Todavia, várias
indústrias antigas entrarem em falência, como a Usina Bulhões, no ano de 2009,
e a Fábrica de Papel (Portela), no ano de 2017. A expansão urbana e industrial
acelerada, sem uma devida preocupação com o planejamento urbano, com os
direitos sociais, com o meio ambiente e com a preservação do Patrimônio
Histórico e Cultural tem sido uma característica do atual município do Jaboatão
dos Guararapes, levando à destruição e descaracterização de vários sítios
históricos, principalmente dos antigos engenhos e das vilas operárias.
sexta-feira, 22 de julho de 2022
Cachoeira do Manassu - Cascata
Por James Davidson
Em virtude das terríveis enchentes que atingiram o estado nos últimos meses, conseguimos fazer o registro de uma preciosidade escondida dentro de Jaboatão. A cachoeira do Riacho Manassu, localizada no Bairro da Cascata, voltou a ser visível e audível, situação que não acontecia há vários anos. As invasões das margens fluviais, a falta de tratamento do esgoto sanitário, as ocupações irregulares impedem muita vezes que o fenômeno se torne perceptível ao transeunte nas demais épocas do ano. No passado, todavia, não era assim, sendo a cachoeira não apenas visível mais também audível centenas de metros de distância, fato notório aos moradores mais antigos da localidade da Cascata e cercanias, mas desconhecido das gerações mais novas. Inclusive a própria denominação Cascata vem dessa cachoeira que, todavia, se tornou uma desconhecida da população ao redor.
Apesar do clima de catástrofe que assolou Jaboatão nos últimos meses, não poderíamos de deixar de aproveitar a ocasião para fazer o registro de uma beleza natural que, graças à ação humana, tornou-se na maior parte do tempo um depósito de lixo e de resíduos.
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